ENTREVISTA À ATRAPALHARTE 

(COM PAULO RIBEIRO)

JUNHO 01, 2021

A entrevista de Junho é dedicada à companhia de teatro AtrapalhArte!

À conversa connosco tivemos o fundador, ator e diretor Paulo Ribeiro, que juntamente com a Carla Almeida, é responsável por levar sorrisos, alegria, boa disposição, cultura e língua portuguesa a todos os lugares onde se fala ou ensina português, através do teatro.

A companhia AtrapalhArte é também uma das grandes impulsionadoras do teatro infantil online ou mesmo do teatro online em Portugal. Nesta entrevista vamos desvendar um pouco o seu trabalho, as atividades que estão a desenvolver no momento e o que planeiam continuar a fazer.

 

WOU: Quando é que nasceu a ideia de ter uma companhia de Teatro? Já era um sonho de infância?

Paulo Ribeiro: A companhia Atrapalharte surgiu em 2012. Primeiro porque eu quis muito que ela aparecesse e depois foi uma “pedrada no charco” do teatro que era costume fazer e que era levado às escolas. As companhias iam às escolas mas havia muito poucas a fazê-lo.

Então, surgiu a ideia de criar um grupo de teatro de improviso. Éramos quatro amigos formados na escola de teatro S. Teutónio. Eu na altura trabalhava no colégio de S. Teutónio e sempre gostei muito de comédia e de desafios, portanto nasce do juntar de várias peças e da vontade de quatro cabeças para criar teatro de improviso para vários públicos, associações, juntas de freguesia, festas de catequese, etc. No teatro de improviso é preciso estar muito atento, recetivo e generoso para com o outro e passámos isso para a nossa primeira peça, Serafim Malacueca.

Atrapalharte era na sua essência uma companhia que usava a comédia, o improviso e a boa disposição para cativar os alunos. Divertíamo-nos genuinamente e o público acabava por ir connosco. Fomos adicionando alunos ao teatro de improviso que fazíamos (…) e o público foi-se definindo. Cada espetáculo era único. (…)

“No teatro de improviso é preciso estar muito atento, recetivo e generoso para com o outro (…)”

Como surgiu o nome AtrapalhArte?

O nome inclui a parte da “arte” que procuramos seguir e que merece todo o nosso respeito, mas a arte de conseguirmos tocar no coração e na alma de uma criança é muito difícil e nós temos de saber chegar lá. (…)

Desde que gerem o Atrapalharte já fizeram atuações praticamente por todo o país. Conseguem destacar dois momentos marcantes?

Recordo-me em 2012, no princípio, quando fomos a primeira vez ao Soajo, na Serra do Gerês. Na altura, fizemos as escolas todas de Arcos de Valdevez e fomos às 6h da manhã para o Soajo, com nevoeiro, vacas a pastar, etc.

Lembro-me que fizemos espetáculo num centro de dia e tínhamos 14 crianças que pareciam que estavam a ver televisão. Eles estavam vidrados. A peça acabou e foi uma coisa tão engrandecedora para nós. Os miúdos estavam lá sempre.

Um outro episódio foi quando fomos à Suíça e tivemos contacto com os emigrantes portugueses, a diáspora portuguesa. Normalmente vão músicos, mas nós levámos teatro. Passámos lá quase um mês em que eles iam ver os espetáculos de um sítio ao outro. Sentir o carinho dos emigrantes lá fora é incrível. Foi sempre engrandecedor. (…)

Falando agora um pouco dos últimos tempos, sabemos que a pandemia afetou o teatro. Consegues contar-nos na primeira pessoa como foi a vossa experiência e como ultrapassaram esta fase? O que é o teatro pré e pós pandemia?

A AtrapalhArte antes da pandemia tinha uma equipa bastante grande. Tínhamos três espetáculos sempre na estrada, com dois espetáculos por dia, por vezes três. E estou a falar de dois espetáculos por dia, cada equipa. (…) Isto, duas equipas sempre a trabalhar. Tínhamos uma terceira equipa que fazia espetáculos de bonecos para os mais pequenos, pré-escolares e jardim de infância, e outra equipa que fazia apenas a Farsa de Inês Pereira.

Eram tempos duros, eram tempos em que toda a gente pensava que tinha tudo por garantido e que de um momento para o outro…lembro-me de estar em Penafiel e de dizer: “O  espetáculo de amanhã já não vai acontecer por causa do Covid.” (…) Foi ali que caiu o pingo da chuva na testa de “isto talvez venha fazer aqui algum estrago”, e o que é certo é que aconteceu.

Entretanto, essa grande equipa teve que seguir outros caminhos porque foi muito tempo fechado e a AtrapalhArte não teve condições, assim como muitas empresas, para suportar. Mesmo com os apoios governamentais  que puseram à nossa disposição, não foi possível. Nós vivíamos apenas do nosso trabalho, não tínhamos qualquer outro tipo de apoio, nunca foi necessário qualquer tipo de patrocínio. Tínhamos equipas boas e vivíamos exclusivamente do nosso trabalho, dos nossos rendimentos. (…) De um momento para o outro deixámos de poder trabalhar, foi frustrante, foi mesmo muito complicado.

Felizmente ficou a pessoa certa, houve alguém que não me deixou desistir que foi a Carla Almeida. Ela foi a responsável por pôr tudo isto a andar, ela é uma força da natureza. (…)

Na altura estava tudo fechado, sem saber o que aí viria, sem cultura. Logo que tudo fechou fizemos logo um brainstorming para saber o que poderíamos fazer. Pensámos numa plataforma online de teatro-educação, aulas, workshops, peças online. (….)

Eu fazia diretos todos os dias, no Instagram, Facebook e YouTube, contava histórias para cativar os miúdos. A Carla também reinventava-se todos os dias, com vídeos, testemunhos, contactos, etc.

Passados dois meses mais ou menos, recebemos uma chamada da Ana Rocha de uma associação de pais de Aveiro, a solicitar atividades para o Dia da Criança. Mas estava tudo fechado, não nos ocorria ainda nenhuma hipótese. Até que a Ana me pergunta: “Porque é que não fazem as peças online?”. Foi aí que surgiu a solução, apesar de nem sabermos ainda como o fazer. Eu costumo dizer que a Ana Rocha foi a mentora da AtrapalhArte Remote.

Assim, arranjámos uma pequena equipa de vídeo e no dia 1 de Julho de 2020 fizemos o nosso primeiro direto live streaming através do YouTube. Fizemos três sessões de Príncipe Nabo e tivemos cerca de 10.000 acessos nesse dia. (…)

A partir daí replicamos nos mesmos moldes com um espetáculo que já estava pré-gravado de apresentações ao vivo, que era o Príncipe Nabo e o Vicente e Ladino. No final do ano letivo conheci-vos e apareceram no momento certo. Juntámos as duas vontades (…).

Dia 1 de Junho é o dia mundial da criança e têm uma iniciativa para esse dia. Podem falar um bocadinho sobre ela?

No dia 1 de Junho 2021 fazemos um ano de streamings e gravações de peças, e vai haver uma peça que vai ser transmitida ao vivo na Casa da Escrita em Coimbra. A peça chama-se Robertices e conta a história da Carochinha e do Freguês Caloteiro. Chama-se Robertices por causa do universo dos “Robertos”. Era muito comum, noutros tempos, ir um senhor com os seus bonecos que enfiava nos dedos e montava o seu cenário, que ficava na praça principal das aldeias ou das cidades. As pessoas juntavam-se a ver. (…)

A nossa peça não vai ser uma história normal, vai ter uma capa de 2021, com outra realidade, outra abordagem. Já temos uma série de inscrições de escolas de Norte a Sul do país que vão assistir e queremos sempre chagar a mais sítios, a mais crianças. O céu é o limite.

live vai ser transmitido em direto no dia 1 de Junho, entre as 9h-10h. A partir daí o espetáculo gravado fica disponível na plataforma WOU e disponível a quem quiser aceder. A peça online acaba por ser uma ferramenta de estudo, um apoio à educação, às escolas.

“(…) pensámos que era o fim e provavelmente será o início.”

O que vos falta fazer enquanto Atrapalharte?

Nós queremos continuar a fazer espetáculos presenciais sem dúvida nenhuma. Queremos continuar a fazer teatro para as escolas e para o Plano Nacional de Leitura. Queremos ser uma referência, que quando se fale em teatro educativo, se associe logo o nome da AtrapalhArte.

Nós continuamos cá com a mesma identidade e a mesma forma de fazer as coisas. (…)

Gostaríamos no futuro de produzir peças online em que as pessoas tivessem a possibilidade de escolher dois finais alternativos: opção A ou B. À semelhança das séries interativas. (…)

De qualquer forma, a maravilha do futuro é que não está escrito, este ano já fizemos tanta coisa, parece que passou uma vida, e só passou um ano. Passámos por tanta coisa, pensámos que era o fim e provavelmente será o início. (…)

Assiste à entrevista integral no canal Youtube WOU.

Todas as peças de teatro online estão disponíveis aqui.

Visita também o website da AtrapalhArte em atrapalharte.pt